domingo, 27 de novembro de 2011

ORA! DEUSES NÃO SANGRAM...






Do pantheon meus orixás me olham,
ora indignados, ora incrédulos.
Difícil é me entender na crise de ira
ou na ingenuidade da esperança...
Do pantheon meus orixás me olham estupefatos...
Ora, os deuses!
Deuses não amam. Deuses não odeiam.
Deuses não sangram!
Nunca foram mulher ou criança...
Do pantheon meus orixás me espiam por detrás do pano.
Com eles nunca aprendi a arte da fleugma...
Mas sempre lhes ensino a suprema dor de ser humano.

Lucia Helena Corrêa
São Paulo, 2011, mês da consciência negra.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

REFLEXÕES SOBRE A VIDA - Por Sérgio Fonseca





A filósofa capixaba Viviane Mosé - que lança novo livro, "O Homem que Sabe: do Homo Sapiens à Crise da Razão" - deu uma entrevista bastante estimulante recentemente. Ela tratou de vários assuntos interessantes, sobretudo quando abordou os aspectos irônicos do indivíduo pós-moderno. A realização dos sonhos e a a utopia já fazem parte do catálogo da era passada. Realizaram-se, mas deixaram um alto déficit na conta da história contemporânea.
A abundância de bens e serviços mostrou que o acesso ao consumo não recobre os complexos desejos e a interminável busca pela felicidade que cultivamos há séculos. Continuamos angustiados, apesar dos bolsos cheios. Um dilema moral-existencial que afetou todas as sociedades modernas prósperas, materialistas e futuristas no século XX.

O príncipe encantado virou um "chato". A vida idealizada, na cidade ou mesmo na "casinha de sapê", não existe, é jogada política ou tara de vigilância do Estado, artifício de publicidade, representação de supostas emoções humanas, ficções platônicas de mundo.

Os modelos de família que balizaram a civilização cristã moderna se desmancham chocantemente diante de nós. O atual modo de produzir e consumir, que é insustentável, torna-se obsoleto, levando consigo um punhado de valores que achávamos eternos e imutáveis. O solo dos valores balança de modo intenso e cria imagens de vida estupendas.

Se Nietzsche tinha razão, então a tese de Arthur Schopenhauer de que o sofrimento é a essência da vida assume a dianteira do debate. Segundo Mosé, podemos "usar" em nosso próprio proveito a dor e o sofrimento, sem nenhuma necessidade de artificializá-los.

Pode o sofrimento sustentar a vontade de viver? Na arte e na religião pode. Nietzsche vai além, ele avança até o ponto da virada de uma vontade negativista para uma positiva, da potência e do querer viver mais.

Ele exigia do indivíduo moderno que fosse forte o suficiente para lidar com um mundo niilista, um deserto de valores. Nietzsche sugeriu que um tal ser extraordinário, o super-humano, tinha o dever de produzir valores positivos, ainda que carentes de fundamentos sólidos.

E é por isso que Viviane Mosé parece, salvo outro juízo, querer contribuir para o novo homem e a nova mulher com uma imagem de mundo simples: quando for sair para o carnaval não se esqueça de levar debaixo dos braços a dor e o sofrimento, pois eles, pode ter certeza, serão os seus únicos faróis confiáveis!

Sérgio Fonseca é historiador